Já não me basta extinguir a rede social. Já não me basta evitar a ideia de que o registro da vida é uma fabricação e o fato registrado é criteriosamente escolhido. Tenho ciência das desgraças que nos acomete enquanto espécie, membros econômicos, agentes políticos e portadores da capacidade de sonhar. Não acho melhor nem perfeita a vida de quem encontro. Apenas não entendo como podem ter a única coisa que desejo em minha vida e mesmo assim padecerem de qualquer causa.
Eu vivi a perfeição. Eu vivi todos os poemas, todas as promessas, soube que existia o reino dos Céus na Terra. Não foi fabricação a título de vender cursos online, produtos milagrosos ou esquemas de pirâmide. Eu recebi o milagre, não o comprei. Mas só recebi o milagre como forma de demonstrar o quanto há, no mundo, de terrível e indesejado. Recebi este milagre como forma de condenação, pois agora não compreendo a vida sem H. e me adoece a ideia do sofrimento por qualquer parte de um par de amantes. Não é artifício retórico: prefiro a morte que viver sem ela.
Prefiro matar a deixar um estúpido exemplar da espécie humana alegar a realidade do sofrimento enquanto possuidor da possibilidade de amar alguém. Mas talvez ninguém ame e por isso a palavra seja, na prática, tão insignificante; apenas se convive e se trocam carícias por necessidade fisiológica. Pois não entendo sofrer enquanto se ama. E talvez eu só tenha conhecido o amor, que para poucos existiu na Terra, com o objetivo de me desgraçar e de mim se extrair o mais refinado sofrimento.
Talvez eu seja a Magnum Opus da Criatura e sua intricada estrutura replicadora de desgraças. Não sou egocêntrica, há várias pessoas nesta obra. Não creio conter mentiras no livro sobre o Jovem Werther ou nos textos de Camus. Mas também não creio no indivíduo que diz sofrer enquanto diz amar. E não creio no fato de ter a experiência do amor apenas para ser imersa no esquecimento e no abandono, enquanto todas as pessoas ao meu redor desfrutam suas companhias e, mesmo assim, sofrem. Não há qualquer coerência e há excesso de coincidências para aceitar tais circunstâncias como mera eventualidade.
Não é real o comum discurso da ambivalência do valor dos eventos da vida. Não há lado ruim no amor. O ruim é a falta, a saudade. É a traição e a mentira. É dizer amar sem o abandono de todas as outras "alegrias" terrenas, pequenas e rotineiras. Não é possível desfrutar o café, o cantar dos pássaros, o silêncio ou o barulho após conhecer o amor e, especialmente, viver sem ele. Este é o canal de iluminação da consciência e emancipação da alma. Torna-se irrelevante tanto o café como a morte; desfruta-o porque tudo é belo, pois se ama; esquece-a porque não há dor, pois se ama. Quando não se ama, tudo é igualmente irrelevante, porém de efeito contrário. O café é asqueroso porque tudo é horrível. A morte é condenação e derrota porque tudo é destruidor.
Não li, não vi, não me contaram. Eu amei e já não tenho mais o que encontrar na vida senão sua lembrança, mesmo a custo do luto permanente e autopenitência.